Juro que não percebo...

... qual é o drama dos professores. É um nunca acabar de queixas, sempre mal explicadas. Concentrações e manifestações que ninguém percebe porquê e cada vez que se tenta perceber recebem-se umas frases isotéricas tipo "Este Governo trata muito mal os professores.... Tu que trabalhar no privado não entendes". Eh pá, porra, expliquem-me!
É que visto de fora, são uns meninos um bocadinho choramingas por nada. 20 horas de aulas por semana parece-me que dá um tempo razoável para preparação e para reuniões de avaliação. Acredito que na altura dos testes, a correcção implique umas horas de trabalho adicional que não são pagas. Mas quem trabalha no privado também faz muitas horas extra que não são pagas.
Pois, mas estou a esquecer-me de uma coisa: no privado a malta tem objectivos claros, sabe que não há empregos para a vida e sabe que tem de fazer a sua parte para que a empresa avance. Claro que em todo o lado há sempre uns que não pensam assim mas não são tantos quanto isso. Ou disfarçam melhor. Mas os funcionários públicos acham-se com direito a ter emprego para sempre, com um pancadão de regalias asseguradas sem que ninguém comente nada. E portanto quando se fala em avaliar os meninos (e claro que os sistemas de avaliação podem ser melhores ou piores) fica tudo histérico.
Eu conheço bons professores. Sou orgulhosamente sobrinha de um deles. Um senhor que até agora ainda não descobriu uma criança que não dobre, um puto que não o respeite. E que também tem muitas reuniões e muita chatice e que por ser tão bom ganha logo o direito de ser nomeado para mil reuniões. Mas não o vejo queixar-se assim. Vejo-o cansado mas também o vejo de olhos a brilhar quando fala dos miúdos. Se calhar é isso que me falta ver nos outros professores: os olhos a brilhar quando falam dos alunos. Porque é para isso que os professores existem, deixem que lhes lembrem: para ensinar, para estimular. E no fundo no fundo, acho que o problema está aqui. Os professores deviam ter como critério de selecção a vocação para professor. Devia ser o objectivo da vida deles ver os alunos a crescer e a chegar mais longe. Ser professor não devia ser a tábua de salvação para um curso superior que se queria muito tirar mas que depois não tem saída profissional.
E portanto, daqui para a frente, a não ser que seja o meu tio ou professor equivalente (leia-se com real amor aos alunos e comprometido a tornar este mundo melhor) a dizer mal do sistema de ensino e a dizer que não lhe deixam ensinar as criancinhas, eu não vou acreditar nas chorminguices. Nem me vou dar ao trabalho de as ouvir.

Comentários

Tobias disse…
bom....como o blog é teu, suponho que como não queres ouvir defesas, até podes apagar o meu comentário, mas vou dar-to, ainda assim. É indiscutível que a condição mais importante para se ser professor era ter vocação para o ser. Mas isso é o que é menos tido em conta. Quer sejam professores, quer sejam médicos. Nas melhores empresas privadas, em que as "matérias primas" nem sequer são outras pessoas, qualquer colaborador tem de fazer um teste psicotécnico e afins. Se os professores não o fazem a culpa é de quem? Outro ponto importante e agora em voga é a avaliação de professores. Concordo plenamente com isso. Não concordo é que quem supostamente a faça ou quem foi proposto para entrar na dita avaliação não tenha preparação para o fazer. Os pais? Muitos dos pais são de facto conscienciosos e graças aos santinhos sabem manter os olhos abertos e aceitar que os filhos possam não ser perfeitos e que não nascem ensinados e que para aprender têm de se empenhar e lutar por adquirir esses conhecimentos. E que quando têm uma avaliação menos positiva é porque a merecem e que têm de se esforçar mais. Mas hoje em dia a culpa é de todos menos das preciosas criancinhas, muitas das quais têm entre elas e os pais um muro de brinquedos e bens materiais intranponível, que não permite que se enxergue as "crias" e que as ajudem como verdadeiramente deveria ser feito. Em vez disso a culpa é do professor que é mau, frustrado e exigente (nalguns meios) ou que é um "valente fdp" que devia de "comer nos cornos" todos os dias (noutros meios). E pensam "se o professor foi mau com o nosso filho, vamos fazer uma avaliação justa porquê?!"
Tobias disse…
Quanto à avaliação ser feita por inspectores... Quando estive a dar aulas a minha escola foi alvo de uma inspecção. Funcionou desta forma: o inspector chegou lá e anunciou "tenho de assistir a x aulas de ciências, y de matemática, z de inglês...". Depois entre os professores, discutiu-se quem iria ser assistido. E quem foram os seleccionados? Os prof. orientadores de estágio, ou outros por outros meios reconhecidamente bons entre os pares. Portanto, a menos que o governo de facto queira fazer uma avaliação justa e prepare de facto quem as faça, avaliação de professores é actualmente uma utopia e merece que se lute cointra ela nestes termos.
Tobias disse…
outro ponto são as horas extra. Eu tb faço horas extra. E não recebo de facto mais por elas. Mas todos os meus colaboradores quando fazem horas extra (e fazem-nas) recebem mais por isso. É de lei. E quem trabalha horas extra e não recebe mais por isso é "lorpa" (eu incluida!). Quando os professores lutam por isso acho bem. Sim, de facto só dão 23 horas de aulas por semana (acho que até são mais em horário completo), mas os bons professores (e tu tens pelos vistos um exemplo disso, logo deves perceber o que vou referir)para serem bons têm de estudar constantemente, de saber sempre mais seja a nível científico seja em métodos cada vez melhores e mais exigentes de ensino. Se antigamente não sabias a tabuada que te era debitada na ponta da língua, levavas logo uma reguada (levei que me lembre duas e não me considero uma pessoa traumatizada!), hoje em dia se não sabes a tabuada a culpa é do professor que não a "embeleza" o suficiente para que ela seja atractiva, que não a explica à criança como deve de ser, que não lhe cativa a atenção para o assunto. Então tem de ser nas outras horas que o professor se prepara, que cria actividades, que se envolve em projectos escolares, que prepara as avaliações dos alunos, que atende os pais, que se dispõe a ir falar com a família sem lhe pagarem mais por isso porque um miudo está com problemas (aconteceu-me e eu só dei aulas um ano!)... E podes crer, tudo somado são bem mais que 40 horas semanais, que os bons professores de facto fazem com uma sensação de cansaço, mas tb com um sorriso e disponibilidade constante. Porque acreditam naquilo que fazem, porque gostam do que fazem, porque gostam verdadeiramente das crianças e adolescentes que têm "a seu cargo". Agora não me lixem. Se continuam a aperta-los e a dar-lhes cada vez mais condições, se os insultam e enxovalham, se muitas vezes os sujeitam até a agressões físicas... eles não podem protestar!? Podem pois! E que o façam, cada vez mais alto, com o meu apoio!, que não sou professora mas que por lá já passei e sei do que se queixam!
Tobias disse…
....e parei e importunar a tua caixa de comentários. Obriguei-me a isso. :D Isto é um assunto que mexe de facto comigo. Empolgo-me e revolto-me contra muito do que vejo. Desculpa. Mais uma vez imperdoável... :S
Sandra Coelho disse…
Mas ainda bem que o fizeste Tobias. É isso mesmo que eu quero, que alguém discuta estas coisas. Mas a verdade é que continuo sem perceber: qual é o problema? As horas extraordinárias? Os alunos? As avaliações? Se não se começar por lado nenhum, não se vai lá. Vamos avaliar e depois ver o que correu mal.
E sim, claro que quem trabalha tem direito às horas extra. Mas temos mesmo a certeza que durante o resto do tempo as 40 horas semanais são mesmo gastas?
E os testes psicotécnicos.... bom, eu acho que mais do que o que os testes nos possam dizer, cada um tem de ser consciente e perceber intimamente se tem ou não vocação ou, no mínimo, se é verdadeiramente empenhado e se acha que faz um bom trabalho. E peço-lhes que sejam honesto nessa avaliação interna por favor.
Não sei, se calhar estou a ser francamente injusta, mas não gosto de quem passa a vida a queixar-se, de quem já se habituou a fazê-lo o tempo todo e portanto, pelo menos para mim, já perdeu a razão.